As cidades são criativas por que são inteligentes ou são inteligentes por que são criativas? Qual a relação entre essas duas diretrizes que vieram para nortear o desenvolvimento dos municípios daqui para frente?
As discussões acerca do futuro dos ecossistemas se tornaram ainda mais latentes durante o momento em que estamos vivendo, pois expuseram muitas falhas, faltas e fragilidades que estavam, de certa forma, passando despercebidas para boa parte das pessoas. Com a urgência e as demandas simultâneas em diversos setores, a falta de organização e de protocolos ocasionou um colapso.
“O que não vai pelo amor, vai pela dor” e assim entendemos a necessidade de a educação preparar nossas crianças desde a base, do empreendedorismo ser disciplina obrigatória nas grades curriculares, do planejamento urbano ser levado a sério. Sentimos falta de uma malha logística eficiente, das relações internacionais sólidas e da robustez da saúde, sobretudo a pública.
Vai passar, não temos dúvida disso. Cada país vai lidar com a situação à sua maneira e nós aqui à moda Tupiniquim. E não, este não é um termo pejorativo. Entre diversos atributos, nosso povo é famoso por sempre encontrar uma solução para seja lá o que for. É bem verdade também, que nem sempre isso caminha para o lado lícito, legal ou moral, mas quero chamar a sua atenção para o nosso ponto forte: a criatividade.
Parece confuso, mas vamos clarear as ideias daqui em diante. Tudo caminha para um objetivo principal: o bem-estar do cidadão.
Indústria criativa é uma expressão utilizada desde os anos 1990, inicialmente na Austrália e depois na Inglaterra, para se referir às políticas públicas da cultura, mas esse contexto se expandiu e inclui as atividades relacionadas à criação, produção ou comercialização de arte, teatro, filmes, games, softwares de lazer, músicas, teatro e demais produtos correlatos.
Do crescimento do setor criativo e sua abrangência cada vez mais ampla surge o termo Economia Criativa, criado por John Howkins para se referir aos negócios que criam oportunidades inventivas para empreender. Pode parecer mais uma viagem romântica da vida moderna, mas preciso dizer que em 2020 os setores da economia criativa movimentaram no Brasil algo próximo dos R$ 200 bilhões, representando cerca de 3% do PIB (Produto Interno Bruto) nacional.
Viemos da sociedade industrial, onde o valor agregado era na manufatura. Passamos pela pós-industrial, em que o conhecimento e a informação eram mais valorizados, e entramos em uma nova era. Agora a criatividade é a matéria-prima. Exatamente nosso ponto mais forte se transforma em um ativo valioso.
E se considerarmos a criatividade como uma das frentes estratégicas no desenvolvimento das políticas públicas, entendemos facilmente o conceito das Cidades Criativas, em que temos a possibilidade de explorar todo o potencial de talentos das mais diversas áreas, com conhecimentos, habilidades e competências complementares.
Estamos falando da senhora, descendente de indígenas, que cuida de uma horta comunitária, das benzedeiras, do artesão que confecciona móveis de fibras naturais, das pequenas e médias empresas e das grandes indústrias, cada um atuando e cumprindo o seu papel no ecossistema, contribuindo para um objetivo comum: o bem-estar da população.
O impacto na geração de renda e, consequentemente, no modelo econômico acontece, assim como a descoberta de soluções e talentos antes desconhecidos pela comunidade.
No livro “Cidades Criativas”, o autor Victor Mirshawka cita a presença dos 4 Ts aliados a outros fatores para que as cidades obtenham tal classificação, a saber: Tecnologia (e seus avanços), Tesouros (naturais ou construídos pelo homem), Talentos (relacionados ao conhecimento, instituições de ensino) e Tolerância, no sentido mais amplo da palavra.
O autor ressalta ainda que: “Sabe-se que, assim como os seres humanos, as cidades são organismos únicos. Elas diferem umas das outras, tendo suas próprias histórias, culturas e economias. Elas também possuem níveis diferentes de crescimento e de avanço tecnológico. Assim, de acordo com especialistas em gestão pública, pode-se avaliar o nível de inteligência de uma cidade a partir de um conjunto de dez dimensões: abertura internacional, administração pública, capital humano, coesão social, economia, governança, meio ambiente, mobilidade e transporte, planejamento urbano e tecnologia.”
Quando aliamos criatividade ao que a tecnologia pode nos oferecer, começamos a entender o conceito das Cidades Inteligentes e sua relação com o contexto criativo. Vai além da inclusão social e digital. Com base na evolução da Internet das Coisas (IOT), Inteligência Artificial (AI) e das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) é possível compilar, atualizar e organizar os dados, em nuvem, e disponibilizá-los para as mais diversas aplicações, possibilitando a otimização dos recursos e a interação entre cidade e cidadãos de forma dinâmica, prática e confiável.
Entendemos então, que cidades criativas são diferentes de cidades inteligentes, mas os conceitos são complementares e é possível, arrisco dizer necessário, que este seja o direcionamento na gestão das políticas públicas, visando não apenas cidades sustentáveis, mas orgânicas, vivas e em desenvolvimento constante.
Jean Dunkl
@jeandunkl
CEO da CPD Consultoria, mentor em Gestão Estratégica de Negócios, gestor da Impera (Incubadora de Empresas de Base Tecnológica de Franca) e do MKBZ Studio, voluntário da Singularity University